quarta-feira, maio 12, 2010

UMA HISTÓRA DE TERROR, UMA HISTÓRIA FANTÁSTICA OU UMA HISTÓRIA SATÂNICA?
OU MAIS UMA SIMPLES HISTÓRIA DE ASSOMBRAÇÃO
?



Histórias como esta costuma ser contada nas noites frias, ao redor do fogo, nos sertões do Brasil, talvez em outros lugares do mundo. Histórias simples e singelas, mas que costumam tirar o sono de algumas pessoas. Mas dizem que isso não são apenas histórias que os mais antigos costumavam contar. Alguns juram que é verdade, que aconteceram mesmo. Essa é mais uma delas. Apenas mais uma entre muitas, e só quem viveu sabe contar o que de fato experimentou nessas ocasiões em que o mundo dos mortos convive, por alguns breves momentos, com o mundo dos vivos, ou daqueles que se dizem “vivos”...

O ESTRANHO AVISO
By Luke M. Stephen*


Essa era uma noite especial. Pelo menos para aquele pequeno grupo que se reunia ali, perto do fogo.
Nesta noite, o dono da fazenda se fazia presente. Duas ou três vezes por mês ele saía de São Paulo para visitar sua propriedade no interior de Goiás. Heleno dos Santos era um paulista branco, alto e de expressão fechada. E algumas vezes ele se fazia presente no meio daquela roda, para ouvir as histórias contadas pelos empregados e moradores do lugar. Gente simples, que ali se juntava uma ou duas vezes por semana, em grupos de, no máximo, uma dúzia de pessoas. Grandes pedaços de carne giravam nos espetos, sob o olhar atento de um garoto de pele morena.
Geraldo, um negro velho, era quem mais contava histórias, transmitidas pelos seus antepassados, desde o tempo da escravidão no Brasil. Geraldo já estava aposentado, mas tinha a permissão de viver na propriedade, em troca de pequenos serviços e também pelas fantásticas histórias que costumava contar. Ao seus pés, uma garrafa de aguardente ordinária, barata e forte, que apenas ele parecia ter coragem de beber. Mas era o que ele gostava, era o que estava acostumado.
- O espírito da gente é como uma espécie de fumaça, uma névoa que fica vagando por ai, se a gente morre antes da hora, por acidente, suicídio ou mesmo de morte matada. – Assim, com seu jeito simples de falar, Geraldo deu início à história de hoje. – Permanece desse jeito aqui na terra, até chegar sua hora de ir para a Luz Intensa, ou para as trevas totais. Ou para algum outro lugar.
Parou um pouco para tomar um fôlego e também um bom gole de cachaça.
- Ás vezes, com muito esforço, essa pobre alma consegue tomar a forma de seu corpo terreno, quando quer aparecer para alguém, seja para transmitir alguma mensagem, fazer algum pedido ou outra coisa qualquer. Na maior parte das vezes para anunciar a própria morte a algum parente que está distante...
Para quem o conhecia, Geraldo parecia estar mais inquieto e nervoso nessa noite do quem em qualquer outra ocasião. Mas mesmo assim prosseguiu com a narrativa.
- É verdade que grande parte das pessoas viventes não consegue ouvir uma alma, muito menos enxergar uma delas. É preciso ter algum tipo de percepção mais apurada, algum dom divino ou do malígno, sei lá... Tudo que sei é que só algumas poucas pessoas conseguem ver e ouvir uma alma do outro mundo. Mas alguns conseguem... Isso eu posso garantir! Eu mesmo já vi algumas vezes. Não que eu quisesse ver, mas não tive escolha.
Geraldo de vez em quando lançava olhares disfarçados e sérios para o patrão, como se tivesse intimidado ou incomodado com a presença dele ali.
- E foi o que aconteceu com Braz, um negro escravo aqui mesmo nessa região, quando ainda existia a escravidão no Brasil. Quem me contou essa foi meu falecido pai, que por sua vez tinha ouvido do pai dele, o meu avô Agripino. Braz era um negro forte e trabalhava na lavoura, desde o raiar do dia até quase perto do anoitecer. Ele tinha um irmão mais velho chamado João, um escravo rebelde e turrão, que depois foi vendido em um leilão. Os dois irmãos foram então separados. Passaram-se muitos anos sem que Braz tivesse qualquer notícia do irmão. Certo dia, quando Braz já tinha se lavado e jantado, percebeu alguma coisa perto da porta da senzala. Uma espécie de fumaça muito densa e escura, que foi aos poucos tomando forma de homem. Braz apontava para a estranha aparição, tentando mostrar para os outros que estavam próximos dele, mas ninguém mais ali conseguia ver coisa alguma. Súbito, João soltou um berro assustador, pois a coisa tinha transformado em seu irmão João e se agora estava quase junto dele. João estava todo ensangüentado, as suas vestes transformadas em tiras. Profundas marcas de chicote cobriam quase todo seu corpo. A coisa tentava balbuciar alguma coisa, mas Braz não conseguia ouvir ou entender. Com o susto, caiu de costas no chão duro da senzala, de olhos arregalados e feições carregadas de puro horror. Mas não conseguia tirar os olhos daquela coisa que parecia ser seu irmão. Os outros estavam assustados e algumas mulheres até choravam baixinho. Alguns escravos, embora assustados, ajudaram Braz a levantar. A coisa tinha se tornado novamente fumaça e sumido no ar. Os escravos começaram a entoar um cântico, mais para disfarçar do que qualquer outra coisa, já que o feitor se aproximava rapidamente dali, atraído pela confusão. Porém Braz conseguiu, com esforço, se recuperar, e pode fazer com que o feitor não percebesse nada. Alguns dias se passaram sem que Braz voltasse a ver qualquer sinal da aparição. Mas pouco mais de uma semana depois chegou a notícia que seu irmão João havia fugido do lugar onde trabalhava, sendo recapturado logo em seguida. Não conseguiu resistir ao castigo no tronco, e morreu no começo da noite. Na mesma noite em que apareceu para Braz, cheio de ferimentos e coberto de sangue...
- Isso é bobagem, não acredito nisso! – Interrompeu seu Heleno, com seu vozeirão autoritário. – Não passa de histórias! Interessantes, é verdade, mas simples histórias. Alma, espírito, fantasma, assombração, encosto, demônios, Satanás, e até mesmo o próprio Deus, nada disso existe. É tudo fruto da imaginação fértil do povo...
- Pois pode acreditar, “seu” Heleno, tudo isso existe sim! E mais alguma coisa... – Geraldo estava assustado, olhando para o patrão.
- Besteira, crendice... Coisa de gente simplória, com excesso de fé...
- Não é não, patrão... – Continuou Geraldo. – Agora mesmo, aqui neste terreiro... Estou vendo alguém, uma mulher idosa, bem aí do seu lado, tentando desesperadamente falar alguma coisa ao senhor...
- Uma mulher, idosa? Onde? – Heleno deu uma gargalhada, movimentando os braços ao redor do corpo, como se quisesse tocar em alguma coisa invisível. – Não estou vendo nada, nada! Onde?
- Uma mulher idosa e alta, cabelos curtos e grisalhos, meio gorda, com uma leve cicatriz no canto direito do lábio inferior. Está com um vestido branco, e manca um pouco, parece que tem a perna esquerda um pouco menor... Parece ter urgência em lhe falar...
Heleno parou de rir e empalideceu. Estava sério e assustado agora.
- Mas... Mas... – Balbuciou, incrédulo. – Parece... Não, não pode ser! Você está descrevendo a senhora minha mãe... Ela adora se vestir de branco. Não é possível. Ela está em São Paulo agora. Você está mentindo... Ela está viva... De onde você conhece minha mãe?
- Não conheço, não senhor. E nem sei se o que estou vendo é realmente a senhora sua mãe. Mas tem uma mulher aí e ela está com uma mancha de sangue em seu vestido, bem em cima do coração...
Heleno se afastou dali rapidamente, em direção a sua pick-up preta.
- Agora fiquei muito preocupado! Vou agora mesmo até a cidade ligar para a casa dela e verificar isso. Se for alguma mentira sua, você me paga, negro sujo.
Apontou em direção a um homem alto, que estava sentado próximo. Era Carlos, o capataz da fazenda.
- Carlos, venha comigo. Posso precisar de você.
No dia seguinte, Carlos voltou sozinho para a fazenda, trazendo uma notícia trágica. Mal desceu da pick-up e já foi cercado por vários curiosos.
- O patrão foi de avião para São Paulo. A mãe dele foi morta... Surpreendeu um ladrão em sua casa, gritou para dar o alarme e levou um tiro no peito. Isso aconteceu na noite de ontem, momentos antes do velho Geraldo dizer que viu sua imagem junto do patrão...
Carlos tirou o chapéu, se ajoelhou no chão. Fez o sinal da cruz três vezes, enquanto dirigia um olhar assustado em direção ao céu.
- Que Deus tenha piedade de sua alma! – Falou, com voz firme e forte. – Deus, tenha muita piedade dessa pobre alma...

Aut.: BR0028

*O texto acima possui direitos autorais e não pode ser reproduzido sem a expressa autorização do autor.

Nenhum comentário: